Você já teve um diário em algum momento da sua vida? O hábito de escrever sentimentos e emoções é benéfico para a saúde mental. Inclusive, esse é o princípio por trás da escrita terapêutica, uma técnica usada na área da psicologia para ajudar pacientes a entenderem o que estão sentindo e por quê.
“Trata-se de uma ferramenta usada em terapia para ajudar o paciente a trazer à tona questões que estão arquivadas dentro dele”, explica a palestrante e psicoterapeuta Myriam Durante. “Ao derramar os sentimentos no papel ou no computador, a pessoa pode colocar os pensamentos em perspectiva e, assim, superar as dificuldades”.
Mas como isso funciona? A terapia da escrita consiste em escrever livremente sobre os sentimentos e emoções, sem se preocupar com estrutura e regras gramaticais. Afinal, ninguém mais estará lendo o que estiver escrito (a não ser que seja a sua vontade). “A ideia é que o paciente consiga expressar, de maneira mais leve, traumas, desejos e sentimentos, além de ser um modo de organizar e ver as situações por um novo ângulo”, completa a psicoterapeuta.
A escrita terapêutica foi estudada pela primeira vez nos anos 1980 pelo psicólogo James W. Pennebaker. Como pesquisador, ele conseguiu comprovar a utilidade da prática para a saúde física e mental, após reunir um grupo de pessoas. Elas foram orientadas a escrever sobre si durante 15 minutos sem intervalos e sem se preocuparem com as regras gramaticais.
O grupo foi dividido em dois: um que escreveu sobre sentimentos e pensamentos, e outro que foi orientado a escrever um trauma de forma racional, sem incluir os sentimentos em relação ao episódio traumático. O grupo experimental, que escreveu as emoções, teve resultados melhores do que o grupo controle.
Benefícios da escrita terapêutica
De acordo com a psicóloga Viviane Tavares Pessoa, que atende pela Televita, através da terapia da escrita é possível acessar memórias, emoções e ressignificar traumas vividos.
“Com isso, a pessoa consegue organizar suas ideias, expressar sentimentos e perceber o que pensa ou sente sobre algo, apenas escrevendo. Isso acontece pois, no momento da escrita, ela fica em uma espécie de transe, ou seja, em uma forma diminuída da consciência, podendo diminuir repressões e crenças na hora da escrita”, completa.
São esses, justamente, os benefícios da escrita terapêutica: autoconhecimento, ressignificação de traumas vividos e conexão entre consciente e inconsciente, conforme lista Viviane. Além disso, a ferramenta pode ajudar quem sente dificuldade de expressar o que sente por simplesmente não conseguir entender o que está sentindo.
“[A terapia da escrita] É recomendada quando a pessoa está muito travada e tem dificuldades em contar o que dói em sua alma, se sente envergonhada, constrangida ou está bloqueada”, acrescenta Myriam. “Com crianças, nós usamos desenhos. Elas desenham livremente e acabam trazendo à tona o que está causando angústia, ansiedade e outros transtornos”, conta a especialista.
Além disso, outros estudos indicam que a escrita terapêutica também pode ser benéfica para quem está passando por situações estressantes pontuais. É o caso de uma pesquisa publicada no Journal for Specialists in Pedriatric Nursing.
Os pesquisadores dividiram um grupo de 28 pais que tinham seus filhos internados em Unidades de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) em estado grave e os dividiram em dois grupos: um que utilizou a ferramenta de terapia de escrita e outro que seguiu os cuidados padrões para pais de crianças enfermas. Os resultados do estudo indicam que a escrita terapêutica foi útil para que os pais pudessem identificar sinais de estresse leve a moderado no ambiente da UTIP.
Outro estudo, dessa vez publicado no Journal of Clinical Nursing, mostrou que a escrita terapêutica pode ser usada como uma ferramenta para aumentar a conscientização e melhorar a adaptação para lidar com dores crônicas. Ou seja, a ferramenta poderia ser utilizada em uma abordagem cognitivo-comportamental para facilitar o processo de reabilitação.
Para quem a escrita terapêutica é indicada?
De modo geral, pessoas introvertidas costumam se beneficiar mais com a escrita terapêutica, na opinião de Myriam. “É muito mais fácil contar ao papel do que verbalizar traumas, desejos e sentimentos”, afirma a psicoterapeuta. Geralmente, esse recurso é mais usado em momentos de estresse ou picos de ansiedade.
Porém, a ferramenta pode ser utilizada por todas as pessoas, de todas as idades. “É uma ferramenta simples e necessária”, diz Viviane. “Um exemplo de escrita terapêutica é o diário que, antigamente, era muito utilizado para expressar sentimentos, angústias e segredinhos”, completa.
Como praticar a terapia da escrita?
Para escrever de forma terapêutica, é necessário somente papel e caneta. É possível utilizar um caderno, um diário ou, até mesmo, folhas soltas. Pode-se, também, incluir técnicas de relaxamento antes da escrita, como a meditação, por exemplo. Depois, deixe o texto fluir naturalmente.
“Comece contando fatos da sua rotina e só depois entre nos sentimentos e nas situações. Pense em você como o personagem de um filme e vá colocando no papel o que esse personagem faz e como se sente. A partir daí, o processo tende a correr com naturalidade”, orienta Myriam.
A psicóloga Viviane recomenda, ainda, dois modelos de escrita terapêutica: o “Caderno do Eu”, de Gabriele Ribas, e “Carta Terapêutica”, de John F. Evans. “O primeiro traz uma sequência evolutiva de autoconhecimento enquanto o segundo eu utilizo muito nas questões de lutos, traumas e abusos sexuais, como forma de desabafo e resoluções de traumas”, explica.
Não existe jeito certo de aderir à terapia da escrita. Basta fazer da forma que for melhor e mais fácil para você!
